Inveja

O pequeno café-restaurante onde almoçava foi trespassado. Fiquei com sensação de orfandade: após visitas sucessivas cria-se um misto de amizade e rotina difícil de preencher. Já lá ia sem confirmar que tinha a carteira no bolso: sabia que confiavam. Os talentos da cozinheira e o esmerado serviço à mesa do marido e empregada ganharam uma invejável carteira de clientes que por vezes excedia os lugares disponíveis.

Eu ainda "namorei" o proprietário para ele me dar um estágio não remunerado na cozinha e assim aprender os segredos da cozinheira mas nunca me levou a sério.

Os novos donos porém não conseguiram manter a clientela a qual está reduzida a talvez 1/3. Uma vez o arroz estava cru, outra o frango mal assado, outra faltava o tempero, a sopa perdeu a alma e por aí adiante. Fui deixando aos poucos mas voltei na semana passada. A empregada já não estava: suponho que terá sido despedida.

Tenho inveja do talento mas não dos eventuais lucros do antigo proprietário. Criou um emprego e satisfação nos que o visitavam: alguns provavelmente deixaram o tabuleiro de um quiosque de comida em série para se sentarem a uma mesa num ambiente bem mais agradável.