novembro 15, 2008

A Corália


A Corália era uma cigana que visitava frequentemente a nossa casa. Alta, seca e altiva era sempre bem vinda: vendia cestos e dava notícias sobre a sua família. Os anos foram passando e ela perdeu o marido. Voltou, agora totalmente de preto, com um lenço impecavelmente amarrado debaixo do queixo. Sentava-se no chão e, junto da minha avó, chorou algumas vezes: primeiro pelo marido e depois pelos filhos ingratos. A minha avó, nascida ainda no século XIX, também enviuvou muito cedo e talvez por isso havia uma enorme empatia entre ambas. Conversavam por vezes horas ... algumas vezes repetindo uma à outra as suas vicissitudes.

A Corália partia altiva como de costume no seu passo certo e ritmado. Por vezes não vendia o cesto novo mas levava sempre no outro cesto alguma coisa: umas batatas, cebolas, laranjas e às vezes um chouriço. A casa era pobre mas havia sempre alguma coisa para dar.

Uma vez desapareceu alguns meses e voltou ainda mais magra: tinha estado doente. Vinha mais velha, cansada e decaída. Repetiu as visitas ainda algumas vezes.

Desapareceu de novo .... ouvimos dizer que tinha falecido.
Passados 20 anos, falecida a minha avó entretanto, deixámos de esperar pela Corália.

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